Nesta obra mais que famosa somos introduzidos a um novo olhar debruçado sobre as relações internacionais, não só históricas mas também contemporâneas. Samuel P. Huntington é o responsável pela formalização de um novo tipo de tese através da qual expõe a matriz das relações internacionais e a origem das grandes dinâmicas criadas ao longo de séculos de conflito e coexistência. Neste novo cenário saído da queda do Muro de Berlim e da desintegração do Pacto de Varsóvia, as novas supra-unidades internacionais são as civilizações, e a Teoria das Relações Internacionais não é mais do que o esforço teórico que observa, analisa e estructura os modos de funcionamento entre estes actores. Embora a sua tese não seja original, uma vez que já existia uma prévio ensaio datado do ano de 1953 às mãos de Henri Schmittenner, obra com o título "Les Espaces Vitaux et les Conflitcts de Civilizations", como muito bem relembra o Professour Doutor António Marques Bessa na sua obra "O Olhar de Leviathan" (pág. 154), não deixa de relançar uma problemática para os campos da investigação científica social que ficou para a história como o último grande debate teórico do século XX.
"Tomando as considerações supra mencionadas em linha de conta, há a necessidade de elaborar a devida correlação às actuais comunidades humanas e estabelecer um nexo entre as diferentes concepções de civilização e os povos a que estão adstritas. Para tal há que enumerar um total de 9 Civilizações que, aos olhos deste autor, melhor descrevem as comunidades humanas em quais a Humanidade encontra-se dividida. São elas, sem atender a qualquer tipo de ordem: Ocidental (a Vermelho), Latino-Americana (a Verde Escuro), Africana (a Azul), Islâmica (a Amarelo), Sínica (a Rosa), Hindu (a Verde-Alface), Ortodoxa (a Castanho), Budista (a Lilás) e Japonesa (a Beige). Como é possível depreender das suas designações, a cada qual corresponde um substracto cultural e filosófico muito específico e que ultrapassa em larga e na maioria dos casos as fronteiras de Estados soberanos. Logo, as civilizações são antes agrupamentos culturais e de identidade que se espalham ao longo de vastos territórios contíguos, e que se distinguem de outros agrupamentos de características distintas. Com efeito, torna-se premente a delimitação espacial de cada uma das civilizações mencionadas. Em primeiro lugar, a Civilização Ocidental compreende o que hoje entendemos por Ocidente, ou seja, todo o território da América do Norte excepto o México, a Europa Central, do Sul e do Norte, e no outro lado do globo os distantes países da Austrália, Nova Zelândia e ilhas adjacentes. Na conceptção de Huntington, este é de facto a civilização dominante nas relações internacionais, domínio esse que não provém de uma casualidade recente mas antes de uma construção que atende à lei da complexidade crescente analisada pelo Professor Doutor Adriano Moreira, e que como tal foi a responsável pela sedimentação das bases que atenderam à formação da ordem mundial de matriz europeia. Quanto às outras civilizações também é relativamente fácil fazer corresponder os territórios que as compõem, pelo que procederemos à sua identificação de maneira sumária. à Civilização Latino-Americana correspondem todos os territórios da América Central e do Sul mais o México; à Japonesa única e exclusivamente o Japão; à Budista grande parte do Sudeste Asiático, à região dos Himalaias (Tibete, Nepal, Butão), e actual Mongólia; à Hindu a Índia; a Civilização Sínica é representada pela China, Taiwan, Coreia do Sul e do Norte, Vietname do Sul e do Norte, assim como alguns territórios a Leste da actual fronteira da China com a Mongólia; enquanto que a Civilização Islâmica diz respeito às comunidades islâmicas que se situam em todo o Norte de África, Próximo e Médio Oriente, Corno de África, até aos territórios da Índia e da China a Oeste, e arquipélago da Indonésia, Malásia e Sul das Filipinas; a Africana a toda a região a Sul do Equador, incluíndo Madagáscar; e por último a Ortodoxa, como Rússia e países da Europa de Leste.
Após a feitura deste novo mapa-mundo atendendo às noções de civilização de Samuel P. Huntington, existe ainda uma outra problemática que dá conteúdo pragmático a toda a exposição elaborada na obra. Através de toda a argumentação defendida pelo autor, os próximos grandes conflitos não serão mais travados entre facções pertecentes a ideologias diferentes, nem a Estados que se degladiam entre si para adquirir mais território e recursos, mas antes nas linhas de contacto e fricção entre duas ou mais civilizações. Através de uma nova análise histórica, Huntington afirma que são nestas zonas que têm deflagrado os maiores conflitos bélicos da História da Humanidade, servindo prontamente um relatório mais ou menos pormenorizado de guerras relativamente recentes, como as Guerras Mundiais, o Conflito Israelo-Palestiniano, Conflito entre a China e o Tibete, Conflito de Caxemira, entre muitos outros. Atendendo a esta abordagem, tornam-se compreensíveis muitas das razões que subjazem ao despoletar de tais conflitos, assim como potenciais focos de tensão que susceptíveis de desencadear uma escalada armamentista e posterior conflito armado geral entre Estados inseridos nas respectivas civilizações.